sábado, 19 de fevereiro de 2011

NÃO QUERO QUE ME BATAM



Jogaram-me em uma arena para pagar o que eu devo. No que estendi as mãos, para um breve cumprimento, um golpe me foi dado levando-me à lona. A areia era macia, fora revolvida para amortecer a minha queda.

Não quero que me batam. Estendi uma das mãos apoiando-me em outra, no que esta foi chutada e outra queda degustei; eu vi todo o céu de uma arena tão cercada com madeiras faces mil , todo o apoio que busquei na força dos meus dois braços colocou-me de joelhos.

Não quero que me batam e um sorriso enlargueci, o branco dos meus dentes avermelhou-se num instante. As gotas tão pungentes arrancavam os aplausos de mãos tão estridentes.
Não quero que me batam e com a força dos meus braços e joelhos bem firmados me ergui toda defesa para saudar o cobrador .

Não quero que me batam e já toda recomposta os meus braços eu abri; corri para o encontro quando, separando-nos a distância, uma lança atravessou-me e novamente eu cai. Com o apoio de uma mão e também dos dois joelhos me arrastei até a cerca e ali me apoiei, mas ela era tão solta... não me pôde sustentar; num impulso, não sei de onde, para o centro retornei.

Não quero que me batam e a lança até doía um pouco no meu peito, mas a esquerda me estancava, com a direita acenei. O braço na altura e feliz por agradar, senti profundo golpe na altura do meu punho. Logo o abaixei para esconder o rompimento da articulação.

Não quero que me batam e com o meu ombro tão direito apoiei tão forte clava. No que eu virei o rosto, o frio de um metal atravessou-se em minha face, fiquei desfigurada.

Não quero que me batam e por isso me firmei no apoio dos meus pés, sem muita demora uma intervenção mutilou-me um membro inferior.
Não quero que me batam e resolvi me sentar, fiquei bem quietinha no centro da arena, já não via o que se passava quando os meus olhos foram vazados e também não sei dizer quando rompeu a minha coluna.

Não quero que me batam e entendi que deveria deitar-me na areia daquela cena. Não sei para onde foi a lança, já não a sinto mais em meu peito, já não sinto nada, só a parte do rosto lateja um pouco. Uma voz, tênue e mansa, eu ouvi se aproximando, ordenando que parasse a cobrança neste dia. Senti na minha testa a ponta de um dedo, palavras me informavam que ele voltará até que se finde esta cobrança totalmente indolor.

Não quero que me batam e a todo instante vou vivendo, toda vez, para entregar-me de corpo e alma até pagar o meu credor.

É assim, como esta aqui, muitos outros sem dó nem pena, mutilaram e mutilam as presas que os amam. A Lei Maria da Penha saiu para protegê-las, mas ainda há muitos gemidos de amores escondidos, pois preferem sofrer caladas a perderem os seus predadores-maridos.


Autoria - Rita Lavoyer

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